sexta-feira, 22 de abril de 2022

protesto na CNA, manifestantes denunciam agronegócio e fome no país Na manhã desta quarta-feira (20), cerca de 30 manifestantes realizaram um protesto na sede da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), em Brasília (DF) Notícias 20 de abril de 2022 Foto: Divulgação Da Página do MST Na manhã desta quarta-feira (20), manifestantes realizaram um protesto na sede da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), em Brasília, DF. O protesto buscou denunciar a aliança entre o agronegócio e o governo de Jair Bolsonaro, a qual é responsável por garantir lucros recordes para o setor, enquanto milhões de brasileiros sofrem com a fome e a alta do preço dos alimentos. A ação fez parte da Jornada Nacional de Luta em Defesa da Reforma Agrária, que ocorre em todo país durante este mês de abril e que traz o lema “Terra, Teto e Pão”. Ao todo, o MST já realizou mais de 50 ações em todas as regiões do país neste mês. A Jornada lembra o 17 de abril de 1996, em Eldorado do Carajás, quando duas tropas da Polícia Militar do Pará atiram contra 1.500 famílias de trabalhadores rurais Sem Terra que marchavam em direção a Belém com o objetivo de reivindicar a desapropriação de terras para Reforma Agrária. O resultado da operação é o Massacre de Eldorado do Carajás, com 19 Sem Terra barbaramente assassinados no local e 2 que morreram logo em seguida por conta dos ferimentos. “O caráter da nossa jornada é tomar as ruas com a pauta da Reforma Agrária Popular, e dizer que a Reforma Agrária não é uma pauta vencida para os(as) trabalhadores(as), que dependem ainda de um pedaço de terra para alcançar a dignidade”, afirma Idalice Nunes, da direção do MST no Mato Grosso. Para a dirigente, o problema do Brasil só vai se resolver com a distribuição de renda e uma das formas de distribuir renda nesse país, segundo Nunes, é fazendo a Reforma Agrária. Na ação na CNA, os manifestantes usaram uma balança, na qual estava escrita a pergunta “quem te alimenta?”, para contrapor o projeto do agronegócio e da Reforma Agrária Popular. Eles também cantavam “o Brasil está sangrando, a fome reinando, o povo morrendo e o agro lucrando”. A Confederação Nacional da Agricultura foi criada em 1951 e tornou-se, desde então, uma das principais entidades representativa e organizativa do agronegócio brasileiro. Integram o Sistema CNA as 27 federações de agricultura e pecuária, que atuam nos Estados e no Distrito Federal, e mais de dois mil sindicatos rurais. A entidade também compõe, atualmente, o Instituto Pensar Agro, considerado o braço empresarial e econômico da bancada ruralista. A articulação entre estes dois grupos é responsável por colocar em pautas os interesses do agronegócio no Congresso Federal. Para Idalice Nunes, o agronegócio só destrói, mata e expulsa gente do campo, seja por meio da grilagem e da jagunçagem ou pelo uso de agrotóxicos. “As médias e pequenas propriedades de terra desse país são quem produz alimentos. O Brasil só vai ter soberania alimentar, quando de fato acontecer a Reforma Agrária nesse país”, afirma a dirigente. O agronegócio representa atualmente um dos pilares de sustentação do governo Bolsonaro. Ao lado do ex-militar desde sua campanha para Presidente, o setor agropecuário está presente em cargos do primeiro escalão do governo. Tereza Cristina, ex-Ministra da Agricultura, já foi líder da bancada ruralista. Ricardo Salles, ex-Ministro do Meio Ambiente, afirmou que o governo tinha que aproveitar a pandemia para “passar a boiada”, ou seja, avançar na flexibilização das leis ambientais. Onyx Lorenzoni, que ocupou vários Ministérios do governo Bolsonaro, também é membro da Frente Parlamentar da Agropecuária. Agronegócio condena milhões à fome Foto: Divulgação Em uma pesquisa feita pelo economista Matheus Peçanha, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV IBRE), no período de um ano, o “prato feito”, forma de alimentação comum para milhões de brasileiros, subiu praticamente o triplo da inflação. O arroz, por exemplo, teve um aumento de 70% em 12 meses. Em geral, o aumento dos preços dos alimentos atingiu 14,09%, enquanto a inflação oficial foi de 6,29%, em 2020. Tweet De acordo com estudo realizado pela Rede Penssan, em 2021 cerca de 116 milhões de pessoas viviam com algum nível de insegurança alimentar no Brasil. Destes, mais de 19 milhões estavam em insegurança alimentar grave. Ao mesmo tempo em que os preços dos alimentos sofrem altas significativas, o agronegócio bateu recordes de exportações de commodities. Em 2021, o total exportado pelo agronegócio resultou em mais de 120 bilhões de dólares, o que representa uma alta de 19,7% em relação ao ano anterior. Segundo dados da Secretaria de Comércio e Relações Internacionais (SCRI), os destaques foram para soja em grãos (2,71 milhões de toneladas); farelo de soja (1,72 milhão de toneladas); celulose (1,64 milhão de toneladas); e carnes (667 mil toneladas). Como é possível o agronegócio, que se apresenta como principal provedor de riquezas e alimentos para o país, bater recorde de lucros enquanto a fome aumenta no país? A resposta para esta contradição pode estar no modelo de produção no qual se baseia o agronegócio. Antônio Pereira, da direção nacional do MST, contesta esta tese defendida pelo agronegócio, ao refletir sobre as ações realizadas pelos latifundiários durante a pandemia de covid-19. “Nesse período da pandemia não vimos o agro do campo fazendo campanha de solidariedade ou distribuindo alimentos pelo país. Enquanto o nosso povo passa fome, quem faz a solidariedade é a Reforma Agrária, por meio dos nossos assentamentos e acampamentos”, reflete Pereira. Um dado importante que ilustra a forma como o agronegócio atua diz respeito ao mercado da carne bovina no Brasil. No ano passado, o consumo de carne alcançou o menor índice em 16 anos. Foi um recuo de 10%, comparado a 2020. O motivo desta diminuição está principalmente ligado às altas dos preços. Em junho de 2021, considerando o acumulado em 12 meses, o brasileiro pagava 38,17% a mais pelo item do que um ano antes. Paralelo a este cenário, a China, principal importadora de carne do Brasil, suspendeu as exportações, por conta de dois casos atípicos de “mal da vaca louca”. Com menos carne para exportação e alta dos preços no mercado interno, esperava-se que os produtores de gado bovino direcionassem seus abates para os açougues brasileiros. Contudo, os fazendeiros optaram por outra estratégia. Em pesquisa sobre a produção brasileira de animais, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) concluiu que o número de bovinos abatidos recuou 11,1% no terceiro trimestre de 2021. Ou seja, o agronegócio preferiu deixar o gado no pasto e esperar o embargo chinês terminar a abater seus bois para abastecer os açougues brasileiros. A área destinada para o cultivo de itens básicos do prato do brasileiro é cada vez menor também. O geógrafo brasileiro Carlos Walter Porto-Gonçalves, em artigo publicado com título “O Agro é tudo, mas só conta a metade”, afirma que em 1988, o Brasil possuía 24,7% de áreas agricultáveis ocupadas por itens da cesta básica, como arroz, feijão e mandioca. Em 2018, essa área caiu para 7,7%.

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